05/04/2011

A BEATA E O PADRE NO CONFESSIONÁRIO

- Padre: eu preciso de sua bênção, pois sou uma grande pecadora. Fez o sinal da cruz e bateu no peito três vezes.
- Está bem! Está bem! Há quanto tempo não se confessa?
- Há uma semana. Eu me confesso toda a semana com o padre Mateus. Ele é muito bom e compreensivo, mas está viajando. Por isso vim com o senhor.
- Quais são os seus pecados?
- Não sei como começar. São tantos...
- Coragem minha filha! Coragem! Deus é misericordioso...
- Lá na vila onde eu moro, as vizinhas dizem que sou “fofoqueira”. Não é verdade. Não posso ficar calada quando vejo tantos escândalos.
- Elas também dizem que sou mentirosa...Às vezes falo alguma mentira (quem não fala), mas que não prejudica ninguém. O padre Mateus diz que é preciso tomar cuidado com a língua, pois o diabo fala do mesmo jeito.
- O padre Mateus é muito rigoroso! Vamos em frente. Isto não é pecado!
- Eu levanto à noite e vou à geladeira comer manjar branco com ameixa. O meu marido briga comigo. Diz que estou ficando um “bofe”. Ele tem razão: apareceu umas gordurinhas aqui dos lados. Já estou com 75 quilos!
- É melhor a senhora “esquecer” a geladeira, mas isto não é pecado. Eu também, às vezes, à noite, vou na geladeira do convento. Afinal, a senhora está preocupada com o pecado da gula ou com a sua estética?
- Para falar a verdade... com os dois.
- Adiante! Adiante!
- O Manoel da padaria olha “esquisito” para mim...
- Como?
- Com cobiça! Eu também olho para ele.
- Com desejo?
- Desejo, não! Desejo, só com o meu marido.
- Que mais minha filha? Que mais?
- Eu tenho inveja da minha vizinha, a Dorotéia. Outro dia ela comprou uma sandália bonita, mas tão cara...
- Isto não tem importância. Eu também gosto da sandália do Padre Tadeu.
- O padre Mateus falou que os invejosos vão para o terceiro círculo do inferno.
- Ele é muito rigoroso...Que mais minha filha, que mais?
- Agora...Eu tenho vergonha de falar...È um grande pecado...
- Coragem, minha filha! Coragem!
- Às vezes, eu falo um palavrão!
- Palavrão? Que palavrão?
Baixinho
- Merda.
-Como?
- Merda.
- Mais alto!
Gritando
- Merda!
Ah!Merda! Merda, eu também falo. Isto não é pecado.
- Que mais minha filha? Que mais?
- Da semana, acho que é só.
- Está bem! Que a paz a acompanhe. Que Deus a proteja. Na próxima vez é bom a senhora se confessar com o padre Mateus.
- E a penitência?
- Não é necessária
- Não é necessária? Como? Depois que eu contei todos esses pecados, venho de longe, gasto dinheiro com condução, perco o meu tempo, o senhor diz que não tem importância! Tinha razão a comadre Joaquina: “nunca se confesse com padres velhos; eles não têm paciência”.
- Padre velho! Ah, agora a senhora pecou por falta de respeito. A penitência: 10 Ave-Marias, 10 Padre-Nossos e 10 Salve-Rainhas.
Irritado.
- Antes que eu me esqueça... Vão à merda a senhora e o padre Mateus.
Abriu com força a portinhola do confessionário, saiu e olhou a estátua de Jesus no altar. Achou que estava de carranca. Caiu no chão, de joelhos, abriu os braços, bateu no peito três vezes e arrependido balbuciou:
-Senhor! Senhor! Agora quem pecou fui eu!

Rodolpho Civile
Medalha de Prata - III Jornada Paulista Médico-Literária / Santos

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