13/11/2011

SEPARAÇÃO

Abri a porta, acendi a luz sentindo uma sensação estranha “dejavu” . Não dei muita importância . Apoiei a bolsa e o pacote de compras no balcão e voltei me para trancar a porta. Ainda de relance observei uma vez mais o belo entardecer que acabara de se formar, sentindo o leve aroma da dama da noite, plantada junto à escada da varanda.
A casa estava imersa num silencio profundo enquanto me dirigia para a cozinha, atualmente muito utilizada depois da ampla e moderna reforma que fiz.. A pouca louça da noite anterior, as taças, a garrafa vazia do Bordeaux degustado ate o ultimo gole, tudo no lugar, como de costume. O que eu faria sem a minha fiel escudeira Dona Joana ?
Comecei a guardar as compras na geladeira, recordando com satisfação da noite anterior, os aromas e a profusão de sabores que exalaram da receita escolhida e preparada a quatro mãos para o jantar. Passamos horas alegres , rimos mais do que o normal principalmente após alguns goles do vinho que fora especialmente selecionado para aquela ocasião e combinou perfeitamente com o momento. Lembramos de algumas situações realmente engraçadas, falamos de pessoas que hoje se tornaram pontos quase esquecidos num passado já um pouco distante, mas que de uma forma ou de outra fizeram parte da nossa história. Quanto tempo havia passado desde então? Não sei, não me lembro ao certo. Mas a sensação que tive, por alguns segundos foi de que ainda possuíamos laços fortes que nos mantinham conectados, apesar da distancia e do tempo que nos afastara.
Quem fora realmente o responsável pelo distanciamento que lentamente fora tomando conta de nossas vidas? Teria sido a ausência de filhos, o excesso de trabalho, a falta de privacidade, as constantes viagens de negócios os compromissos que sempre nos culpávamos por assumir, mas que nada fazíamos para limitá-los?
Tínhamos uma vida confortável e bem estruturada e nos amávamos muito, pelo menos era o que pensávamos. Achávamos que tudo poderia ser resolvido no dia seguinte, ou talvez no final de semana seguinte, ou nas férias seguintes, como se a vida fosse uma ciência exata onde simplesmente se soma , se multiplica, se subtrai e se divide obtendo-se os resultados de forma previsível, na hora em que se quer.
Fomos percebendo o tamanho da distancia que nos separava quando marcamos uma viagem de férias com um casal de amigos e quando eles a cancelaram por motivos pessoais, fizemos o mesmo, pois ficamos com medo de enfrentarmos uma terrível solidão a dois em um local desconhecido e onde não poderíamos compensar nossas frustrações de forma como sempre fazíamos em casa, ou seja nos apegando ao trabalho, que no fim era sempre a nossa válvula de escape.
Poderíamos ter revertido o quadro? Hoje em dia eu acredito que sim. No momento sentimos quase que um alivio em pedirmos um ao outro um tempo. Como se dando um tempo fosse uma solução de aproximação. O que de fato ocorreu é que desfizemos de nosso apartamento e de forma provisória cada um encontrou o seu próprio espaço e o tempo transformou-se em meses, que foram completamente preenchidos por muitas atividades profissionais e outras pessoais, que completavam o nosso dia a dia. De vez em quando nos encontrávamos de forma rápida, ou nos falávamos por telefone . Na verdade não tínhamos muito que falar. Cada um já estava vivendo sua vida da forma que achava melhor e sem muito problema nem de cunho pessoal, nem financeiro, nem social e muito menos religioso, pois ambos tinham uma tendência ao agnosticismo.
Semana passada após muito tempo sem nos vermos de forma real nos encontramos por acaso em um barzinho. Ele estava com uns amigos e eu com uma amiga que veio ao Brasil a trabalho e resolvi mostrar a ela um pouco da noite em São Paulo. Após a surpresa e a coincidência do encontro conversamos um pouco e marcamos um jantarzinho em minha casa para a semana seguinte .
Não sei realmente o que pode ou não acontecer após o jantar de ontem. Foi muito bom, pode ser um recomeço, não digo de uma união estável como já vivenciamos no passado, mas quem sabe de duas pessoas que já se amaram muito e que hoje após novas conquistas e experiências estão em condições de assumirem uma relação mais madura e menos egoísta.
O silencio da casa que sempre me deu uma sensação de paz, hoje esta me angustiando um pouco. Preciso de um pouco de música . Vou tocar o mesmo CD que por coincidência foi a musica de fundo do jantar.
Coincidência ou não , o Andréa Boccelli que ecoa agora pela casa é minha inspiração para preparar meu jantar e quem sabe mais tarde será a minha motivação para telefonar e marcar um novo encontro, ou reencontro com um pouco do meu passado.

Aida Dal Sasso Begliomini

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