11/04/2011

DOCE PERIFERIA PAULISTANA

Uma das coisas que custei a entender em minha cidade adotiva é a discriminação que sofre a sua periferia e a forma mais cruel é exatamente a que acontece dentro da saúde, no atendimento à população.
É comum dizer-se que nos bairros afastados de São Paulo não se encontram médicos e outros profissionais da saúde, pois estes temem os subúrbios por serem agredidos pelos moradores de lá, por serem ofendidos e não terem condições de trabalho. Nada mais falso, excetuando as péssimas condições de trabalho que são oferecidas.
Há mais de 13 anos engajei-me num programa da prefeitura de nome “PAS” (Plano de Atendimento à Saúde), e fui destacado para um posto de saúde num paupérrimo subúrbio paulistano. Rendia-me um bom salário e condições razoáveis, então dei o melhor de mim para aquela população e logo fui reconhecido pela comunidade.
Não que me ache melhor médico do que quem quer que seja, mas procurei tratar aquele povo “na palma da mão”: ouvia-os com respeito, procurava sempre sorrir durante os atendimentos e, enfim, prescrever a medicação adequada; sabe-se que pessoas assim atendidas respondem melhor ao tratamento e era isso que acontecia.
Inicialmente, enfrentei certa desconfiança, pois são cidadãos que se acostumaram a identificar os profissionais da saúde como pessoas estressadas e irritadiças; de fato, muitas vezes recebem estupidez, securas e nenhum engajamento afetivo por parte destes profissionais, como se fossem os grandes culpados pelo descaso em que é jogada a saúde pública brasileira. Normal que um indivíduo desses estranhe ao entrar no consultório e encontrar o médico sorrindo.
Depois, com o malogro do “PAS”, pressenti que a população daquele bairro gostava de mim, então resolvi abrir um consultório lá e conviver com eles e assim conhecê-los melhor.
Na grande maioria, são pessoas honestas e de bons sentimentos, mas de baixa educação, exatamente
como deseja o Estado brasileiro para facilitar as indecências e a incúria que lhes são características. Pessoas sofridas, mas altivas, que respondem com grosserias e agressões sim, mas apenas de forma reativa, quando são maltratados.
Já faz 11 anos que todas as tardes atendo neste consultório, vivo dele e nunca fui maltratado por paciente algum, muito pelo contrário, sinto-me amado pelo povo, que sabe que pode contar comigo nos momentos difíceis.
E faço de tudo, desde conversar com um casal prestes a se separar até ajudar o padre do lugar em suas festas e suas movimentações sociais. Muitos dramas daquela gente terminam em meu consultório.
O povo da periferia paulistana é belo, sincero e honesto. Soa ofensiva e simplista a explicação, para a falta de profissionais, que denigre os cidadãos suburbanos. O povo não agride, apenas se defende.
É lá minha “Pasárgada”. Acredito que terminarei minha vida na Vila Liviero.

Carlos Augusto Ferreira Galvão

Um comentário:

  1. O ESCRITOR DISSECA A URBANIDADE DE SÃO PAULO
    COM SEU OBSERVADOR OLHAR.FOCANDO SEUS MUITOS TIPOS HUMANOS E SEUS MODOS DE VIVEREM E SUBSISTIREM.
    GOSTO DESTE DISSECAR.
    LUIZ JORGE

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