13/06/2011

NÃO SE VIRAM PIPAS NO CÉU

O inverno neste ano foi atípico. Certa noite alguém ao meu lado comentou: não ventou em agosto e não se viram arraias pelo céu! Espantada perguntei o que eram arraias e ele me explicou que eram o brinquedo que chamamos papagaios ou pipas, lá na sua terra, no Maranhão.
Pois é! Agosto passou rápido como um bólido. Foi muito diferente de outros anos. Entre dias muito ensolarados, muito quentes e outros gelados, o mês decorreu neste ano de maneira inusitada. Árvores perderam cedo suas folhas e muito antes da primavera já estavam novamente copadas e muito verdes. Os ipês, que costumam florir em meados de setembro, estavam sem as folhas e já lindamente floridos de amarelo dourado.
Agosto foi diferente. Não houve aquele vento frio que sempre levanta rodamoinhos de terra e folhas, que faz as pessoas se agasalharem e curvadas caminharem, segurando o cabelo, fechando os casacos ou abrigos.
Mas que pena... agosto sem pipas ou papagaios ou quadrados pelo ar, nos parques, nas praças ou nas ruas como antigamente. Um brinquedo simples e barato que tanto divertia a meninada no passado e que com o tempo se sofisticou. Os tempos levaram alguns brinquedos de rua, talvez mais saudáveis por serem ao ar livre e que foram substituídos por jogos eletrônicos, televisão e computadores.
A cidade cresceu, grandes construções, fiações elétricas, torres, acabaram-se os terrenos vazios onde a criançada podia brincar. O papagaio, um brinquedo barato, rústico, que voa, fazia o encantamento de todo menino, de décadas atrás. Qualquer garoto sabia fabricá-lo com duas ou três varetas, de bambu, cruzadas, papel de seda, que podia ser de uma ou mais cores, um pouco de cola, um carretel de linha apanhado na cesta de costura da mãe e umas tiras de pano para fazer o rabo ou rabiola, que era o que dava o equilíbrio ao papagaio. E assim, depois de pronto, após uma corrida, era ir dando linha para que o artefato subisse, aproveitando o vento, que deveria ser constante e forte. O céu se coloria com as diversas formas, flutuando nas alturas. Nem sempre acontecia do brinquedo subir. Não estava bem construído, ou faltava vento e então ele rodopiava e caía. E lá ia toda a criançada, tentar recuperá-lo. Pulavam portões, subiam nos muros, telhados ou em árvores, para resgatá-lo. Aqueles que não tinham como para arranjar o material necessário, cortavam um pedaço de jornal, amarravam com linha, e assim mesmo, corriam felizes, tentando fazê-lo voar em vão. Mas enquanto isso também se divertiam.
É atribuída à China a invenção das pipas ou papagaios ou quadrados, arraias, peixinhos, mas se espalharam pelo oriente e mais tarde pelo mundo todo. Foram usados em ritos religiosos no Japão, em guerras e recentemente foram auxiliares em algumas invenções importantes tais como o para-raio, o telégrafo sem fio e até o avião do Santos Dumont. No Japão constroem-se verdadeiras obras de arte voadoras, nas formas mais diversas.
Com o tempo foram se sofisticando os modelos, criaram-se clubes, lojas onde se podia comprar o kit para fazer um lindo quadrado e surgiram competições.
Há alguns anos atrás houve um filme, Mary Poppins, onde a família reunida ia empinar o brinquedo ao som da música que a governanta cantava. E recentemente, um filme iraniano - O Caçador de Pipas- mostra o encanto e a rivalidade nas competições que se realizam com esse brinquedo, no Irã.
Infelizmente ao lado do pitoresco e do salutar, inventaram o cerol: pó de vidro colado na linha da pipa e que servia para cortar a linha dos brinquedos de outros meninos. Mas esse mesmo cerol acabou sendo usado criminosamente de maneira a ferir séria e até mortalmente ciclistas e motociclistas, para roubar os seus veículos.
Tudo isso me fez, de repente, lembrar meus filhos, pequenos, à beira da praia, nas férias de julho, quando o vento sopra forte e que, como hipnotizados, acompanhavam as suas pipas, que subiam, querendo conquistar o céu e que tinham sido construídas com a ajuda do paciente avô.

Maria do Céu Coutinho Louzã

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