26/07/2011

O BONDE 5 DO BEXIGA

Sem querer, abri o estojinho dourado da minha memória. Fiquei surpreso quando “vi” dois bonecos. Não eram de pano, nem de palha: eram de carne e osso. Falavam, gritavam, gesticulavam. Tinham um sotaque esquisito, “ apertavam” as palavras na boca e no nariz. Percebi que não eram brasileiros... Como nos velhos filmes de cowboy, no tempo das diligências, cavalgavam dois ginetes brancos. Mas, que confusão... Puxa... Até nos sonhos ando confuso. Não estamos em território norte-americano e, sim no Brasil especificamente , em São Paulo, no Bexiga, que é um mundo à parte. Ah! Ah! Agora vejo melhor... É o bonde 5 que, corria, na verdade, andava nos trilhos , percorrendo o bairro dos calabreses. Nele, dois “guapos” rapazes: um mexia nas manivelas e o outro, corria o estribo. Eram o motorneiro e o cobrador. Chamavam-se, respectivamente, Manoel e Joaquim, vindos da “Santa Terrinha”. Os dois eram apaixonados por uma mocinha loira de cabelos curtos e franja tipo Claudette Colbert, que assiduamente tomava o bonde no Largo do Piques, hoje praça das Bandeiras, e, descia na Rui Barbosa. Sempre sorridente, muito simpática, Mariazinha recebia os elogios dos lusitanos, de maneira gentil e prazerosa, mas sem acredita nas palavras e intenções dos “pretendentes.
Um dia aconteceu...
Franco, filho de calabrês, fornecia e distribuía frutas às quitandas do bairro, com uma carroça puxada por um cavalo arisco. Numa bela manhã de maio, estacionou a carroça na Rua Conselheiro Ramalho, defronte a um estabelecimento. O cavalo viu um camundongo passar á sua frente. Agitado, assustado, desembestado, saiu em disparada com o dono correndo atrás dele, desesperado, tentando segurar o animal. Não deu outra... O bonde 5 apareceu, com certa velocidade, conduzido por Manoel. O choque entre o bonde e carroça foi violento. Nele, saíram feridos: Manoel, com um hematoma e um corte na testa; Joaquim que caiu do estribo, fraturou a tíbia da perna esquerda e Franco, que teve escoriações difusas por todo o corpo. O animal conseguiu se desvencilhar da carroça e foi capturado mais adiante. No chão, bananas, laranjas, limões e melancias foram a alegria da criançada que comeu à vontade.
Os três personagens do inesperado e nefasto acontecimento foram enviados à Santa Casa de Misericórdia. Durante a estadia deles, tiveram a satisfação de receber a visita da Mariazinha, a linda donzela. Um verdadeiro bálsamo... O restabelecimento foi rápido, a saúde foi logo restaurada... O que faz o amor!
O destino é caprichoso...
Com o passar do tempo, Mariazinha resolveu se casar. O escolhido? Franco, o filho do calabrês! Os lusitanos, Manoel e Joaquim, continuaram no bonde 5 do Bexiga...
Tudo isso resultado de um “corajoso e destemido” cavalo xucro, assustado por um ratinho de rabinho curto...

Rodolpho Civile

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