26/03/2018

EM BUSCA DA LUZ


por: SHEILA REGINA SARRA
1ª Menção Honrosa no Prêmio Flerts Nebó - 2016/2017

Olhava para o lustre de cristal e não acreditava no que via. Mais uma lâmpada queimada. A última, lembrava bem, ainda não fazia nem uma semana. Apesar de todos os gastos com limpeza e manutenção, adorava a sua sala iluminada pelos reflexos dos cristais. Havia pago uma verdadeira fortuna por ele, mas valia por cada minuto de contemplação e de prazer que lhe proporcionava. E, agora, mais uma lâmpada apagada. Inconscientemente, suas mãos crisparam-se na almofada, numa reação de reprovação e tristeza ante a cena. Teria que ligar novamente para o fabricante e agendar uma visita para desmontar cuidadosamente as peças e trocar a lâmpada queimada. Um transtorno para sua agenda lotada, um contratempo que lhe amargava a noite, um gasto a mais em seu orçamento. Tentou lembrar como fizeram o conserto na última visita. Tinha uma escada, e algumas ferramentas, faltava-lhe apenas o ajudante...

Morava só há muitos anos e se acostumara a viver assim. Fazia companhia para si mesmo e não sentia falta de ninguém, exceto para consertar o lustre. Tinha um certo medo de altura e dois degraus já lhe faziam mal. Tentou ligar para o zelador, mas havia saído. O vizinho, nem pensar. Não ousaria, também, chamar nenhum colega de trabalho àquela hora. Abriu a internet e pôs-se a procurar alguém disponível para um conserto imediato. Achou um pequeno anúncio que dizia: gentleman disponível 24 horas para qualquer programa. Pensou nas palavras e resolveu arriscar, afinal, com dinheiro tudo se pode pedir. Mandou uma mensagem para o número indicado e logo obteve uma resposta. Estava a caminho. Separou as ferramentas, afastou os móveis, colocou algumas facas à disposição, jogou almofadas pelo chão para amortecer a eventual queda de algum cristal e pegou alguns pedaços de fio elétrico para o caso de haver alguma necessidade. Ligou um abajur auxiliar e desligou o lustre.

Em menos de meia hora o interfone tocou e o gentleman subia pelo elevador. Era um rapaz bem novo, com roupas bem talhadas e um suave perfume. Entrou na sala com um ar de curiosidade. Olhou para mim, para as ferramentas, as facas e os fios e saiu correndo. No celular, restou uma mensagem: sadomasoquista eu não atendo.  


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