Tem sido muito difícil nos dias de hoje simplificarmos nossas vidas. Viver virou sinônimo de avaliação e controle de riscos. E o que seria uma vida simples? Acredito eu, seria agirmos de tal forma que a nossa própria vida e situações nos levassem a aprendermos e errarmos sem entrar em crises existenciais. Exemplo: José e Maria são um casal feliz, eles são companheiros, respeitam-se, adoram estar um com o outro, são bons amantes, amam seus filhos, seus pais e seus amigos. Um belo dia um deles lê: Casais que fazem amor três vezes e meia por semana são mais felizes do que aqueles que fazem uma vez e meia. Nós não imaginamos como que é fazer amor uma vez e meia, mas as estatísticas sabem. José e Maria, que nunca contaram as vezes que fizeram amor, começam a fazer cálculos e a se incomodar. José começa a achar que sua mulher é fria e Maria começa a achar que José não a ama.
José e Maria têm três filhos. Eles estudam numa escola do bairro. A escola não é a melhor da cidade mas é adequada, dá uma boa educação e formação e é aquela que eles podem pagar. Seus filhos são bons alunos, fazem suas tarefas, brincam, têm uma boa formação como cidadãos.
Mas! Ouvem no rádio que no ranking das melhores escolas, a deles nem aparece e que a escola “Tam tam” é a melhor. José e Maria estão pensando em mudá-los para a tal escola embora não tenham dinheiro suficiente para tanto. José e Maria terão de trabalhar horas extras e cortar algumas despesas para que eles estudem na escola “tam tam”. Isto quer dizer menos tempo para seus filhos, menos tempo um para com o outro, menos tempo para lazer e menos tempo para manter a estatística dos casais felizes que transam três vezes e meia.
Maria tem uma loja de roupas, a loja é pequena, mas junto com o salário de José que é contador de uma empresa, garantem o sustento da família. Eles não têm dívidas. Maria tem um carro pequeno usado e José tem um Chevete velho que ele deixa em qualquer lugar e ele mesmo diz: - Quem iria querer roubar esse carro?! Um dia Maria lê a revista “Grandes negócios, grandes roubadas”. O artigo diz como ampliar o seu negócio e quintuplicar seus ganhos. Maria aprende palavras novas: otimização, informatização, segmentação, joint venture, financiamentos, recursos humanos, fluxo de caixa, marketing share e uma infinidade de nomes que fazem com que Maria se sinta ultrapassada, incompetente e má administradora. Maria adora o que faz. Tem em seus clientes, amigos.
Seus poucos funcionários são seus parceiros e ela sabe da responsabilidade que tem em manter essas famílias ao pagar seus salários. Entretanto, o apelo da mídia é: Se você quer progredir tem que sair da “zona de conforto” ao que equivale dizer: endivide-se. Pense pequeno e talvez você não cresça; pense grande e seja bem sucedido saindo um dia talvez na mesma revista sorrindo como exemplo de sucesso. Enfim Maria está pensando em mudar de ramo, algo maior, com maiores retornos, afinal como diz o filme do 007: O mundo não é o bastante.
José trabalha duro no seu cotidiano, mas está pensando em fazer um MBA de alguma coisa, afinal a empresa gosta de pessoas motivadas, que deem o sangue pela companhia. Ele vai trabalhar de dia e estudar à noite, para se aprimorar e, talvez, e é talvez mesmo, receber um aumento.
Afinal estatísticas afirmam que aqueles que têm um MBA de qualquer coisa ganham mais. José está triste pois está cansado e gostaria de estar à noite com sua esposa e filhos, conversar, ajudar os filhos na tarefa da escola, conversar com Maria e ficarem abraçados, discutindo os problemas do dia a dia.
José e Maria, quando podem viajar, vão a Praia Grande ou vão ao interior visitar a família em Taubaté. Na praia passeiam pela orla, andam de bicicleta, divertem-se. No interior visitam seus familiares, fazem churrasco, conversam, tomam um vinho na companhia dos amigos. Um dia eles receberam a visita de uns primos distantes, bem sucedidos, e perguntaram se eles já esquiaram em Aspen ou se já estiveram nos parques da Disney. Maria e José se entreolharam e trocaram olhares de interrogação e exclamação. Como é que eles nunca sentiram falta de coisas tão fantásticas e maravilhosas até esse dia?
José abriu uma garrafa de vinho para comemorar a chegada dos primos. – Que safra? Que uva? Perguntou seu primo. José só sabia que o sabor do vinho era bom, mas ele já não achava mais tão bom assim após essa inquirição. José e Maria estão pensando em fazer um curso de vinhos e estão planejando ir ao Exterior no ano que vem. Muitas horas extras de trabalho os aguardam.
São muitos os Josés e Marias neste mundo, felizes em seu modo de viver simples e de pequenas e doces ambições sem se incomodar com os outros até que um dia alguém lhes subtraem a felicidade dizendo que suas vidas são pequenas e insossas. Muitos só se sentem grandes tornando os outros pequenos. Claro que é lícito as pessoas adquirirem o supérfluo. Supérfluo quer dizer demasiado, que vai além do necessário.
Necessário é o tempo. Tempo para os filhos, para sua ou seu companheiro ou companheira, tempo para brincar, tempo para sorrir, tempo para refletir, tempo para se exercitar, tempo para amar. Supérfluo é o carrão, a mansão, a melhor escola, a melhor roupa, o melhor emprego, o maior negócio, a melhor viagem. Se você puder ter o supérfluo, ótimo, mas, não tenha o supérfluo se você não tem o essencial. Acredite. O tempo é inelástico, por isso, não se perca no caminho, seguindo estatísticas inúteis e sem o menor sentido. Não ache problemas onde eles não existem. Não perca a vida tentando ganhá-la. Viva.
José Alberto Vieira
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