20/03/2011

BOLINHOS DE CHUVA

Caía a tarde de verão naquele distante mês de férias na praia, com meus pais e irmãos. Éramos ainda crianças e cheios de muita energia. Esta não se acumulava, pois inventávamos mil atividades fora de casa, ao redor do prédio onde passávamos a temporada. Brincadeiras como corre-corre, pega-pega, lenço atrás, esconde-esconde, queimada, estátua, além de andar de bicicleta, jogar peteca, frescobol eram algumas das que compartilhávamos com nossos amigos, vizinhos do mesmo prédio e também da mesma rua. Até peça de teatro organizávamos, quer dizer meus amigos organizavam. Eu devia ter uns sete anos de idade, então participava da peça como Bela Adormecida quando criança.
Ao lado das inúmeras brincadeiras, lembro-me bem dos fins de tarde ameaçados pela chuva, com ventos noroeste. Era, ao mesmo tempo, assustador e instigante, uma vez que ficávamos à janela, observando os chapéus-de-sol, árvores típicas da região, envergarem-se pelo vento que assobiava em nossos ouvidos; os raios formarem desenhos no céu escuro; e os trovões roncarem a cada seqüência de segundos, contados por nós para saber a distância em que estavam.
Nesses dias de temporais, manter quatro crianças dentro de um apartamento não era tarefa muito fácil para nossos pais. A criatividade corria solta: jogávamos Bingo, marcando os números com feijões, brincávamos de mímica, de Resta Um, de Palavras Cruzadas. Quantas vezes brinquei de Forte Apache!
Mas o que mais me salta à mente eram os bolinhos de chuva preparados por minha mãe, feitos de farinha de trigo, ovos, leite e fermento. Era divertido ver a massa sendo jogada no óleo quente e formar aquelas bolinhas irregulares. O aroma delicioso espalhava-se por toda a casa e a vontade de comê-los era aguçada à medida que mamãe polvilhava-os com açúcar e canela. Quentinhos, com gosto de festa, faziam-nos esquecer a chuva e, por um instante mágico, voltávamos ao Bingo, ao Resta Um, à mímica...
Foram momentos simples, mas inesquecíveis. Hoje, ao pronunciar o nome “bolinho de chuva”, sinto minha mente impregnada de alegres recordações de um tempo em que brincar denotava o alegre convívio num lar abrigado pelo amor e pela segurança de pais e irmãos presentes.

Ligia Terezinha Pezzuto

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