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Opa! O que o senhor está fazendo aqui?
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Eu é que pergunto, afinal a casa é minha! Qual o motivo da sua presença,
vestido de Papai Noel, quebrando a vidraça e interrompendo o meu sono? Ainda
faltam cinco dias para o Natal!
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Peço desculpas! Não é minha intenção...
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Então, qual é? Entrar na casa dos outros é crime!
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O senhor tem razão, mas, eu não sou ladrão. Estou procurando...
-
Procurando o que?
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Uma boneca que vira os olhos e fala “papai e mamãe” e também um trenzinho
elétrico para dar aos meus filhos.
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Então, porque não foi procurar numa loja de brinquedos?
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Aí é que está o problema... Não tenho dinheiro, estou desempregado.
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Qual é a sua profissão?
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Coveiro.
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Puxa que bela profissão!
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A minha mulher quer que eu mude... Por falar nela, eu gostaria de presenteá-la
com um relógio de pulso, mas, é tudo tão caro... O senhor pode me ajudar, mesmo
que seja um empréstimo? Um dia, eu prometo pagar.
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Que piada! Como posso acreditar em você? Entra em minha casa, quebra uma
vidraça, vestido de Papai Noel... Afinal, porque escolheu esta casa?
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Nesta região, só dá gente muito rica. Escolhi a sua casa por ser muito bonita!
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Demonstra bom gosto!
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Que adianta ter bom gosto sem dinheiro? Desempregado como estou... Não
encontro outro emprego...
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Isto é verdade... O grande escritor italiano Giovanni Papini disse que “o
dinheiro é o estrume do diabo”. Ninguém vive sem ele...
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Por favor, o que quer dizer estrume? Eu só tenho o primário.
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Ah! Estrume significa bosta, merda.
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Agora, sim entendi! O senhor fala muito difícil...
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Bem...Vamos pular esta parte. Qual é o seu nome?
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Dimas.
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Que coincidência! O mesmo nome do bom ladrão que foi crucificado com Jesus
Cristo, de acordo com os evangelhos.
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Ele deve estar no Paraíso! Enquanto eu estou na Terra, ou melhor, no Bexiga,
tentando conseguir uns brinquedos...
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De qualquer maneira, é melhor do que ser crucificado. Mudando de assunto: você
está com fome?
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Muita!
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Então vamos até a cozinha, Apague a sua lanterna.
Na
cozinha.
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Olhando o seu rosto ...Você é jovem. Precisa fazer a barba!
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Mas, Papai-Noel tem barba branca e comprida!
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Onde conseguiu esta roupa?
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Num brechó. O senhor está sozinho?
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A minha filha e o meu genro foram a um baile. São moços. Devem aproveitar a
vida, enquanto ela sorri.
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Isto é verdade... Velho só fala em doenças, remédios e morte. Não sei se é o
seu caso...
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Sou médico aposentado, já com os pés na eternidade. Por força da minha
profissão, fiz da minha vida um rosário, um cordão de contas, alegrias e
sofrimentos mesclados, sem explicação. Enquanto isso, ela, a morte, sempre a
espreita... Você entende bem isso: é coveiro. Afinal, porque está desempregado?
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Sorte sua que é médico! É duro suportar um coveiro chefe, briguento, implicante
e mandão. Um chato! Tão chato, que até os mortos perdem a vontade de serem
enterrados!
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Nossa! Gostei de sua explicação. Bem original! De qualquer forma, cada Ser tem
neste mundo um destino...
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É verdade! O meu é de ser um Papai-Noel de saco vazio.
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O extraordinário, meu amigo, é saber que num saco pequeno e vazio podem morar
os sonhos, as ilusões, a felicidade...
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Principalmente para os meus filhos! Por este motivo, não posso decepcioná-los e
estou aqui, conversando com o doutor.
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Não é necessário o título, só o nome: Jorge. A partir de hoje, somos amigos.
Você conseguiu afastar de mim a minha inimiga, a solidão. Velho só vive
assoprando as cinzas do passado. E elas só trazem sofrimento.
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Mas isto não leva nada... Tudo acaba na terra... Nisto tenho bastante
experiência.
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Você tem medo da morte?
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Não! Ela me ajuda a ganhar o pão.
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Bem, visto deste ângulo, você tem razão! Você é um verdadeiro sábio!
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Que exagero! Eu sou um simples coveiro, atualmente desempregado, com o firme
propósito de levar sonhos, naturalmente, dependendo de sua colaboração! Não vai
lhe fazer falta alguns brinquedos...
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Um dia, no futuro bem distante, sem pressa, quando eu bater os “borzeguins” e,
por acaso, você for o coveiro...
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Ah, eu o enterrarei, com muito prazer! Considerando a nossa amizade...
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Gostei da sua franqueza e solidariedade! Estou profundamente impressionado!
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E disposto a me ajudar?
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Sim! O que lhe falta, eu tenho aqui encaixotado, sem uso, mofando.
-Então,
eu vou lhe fazer um favor...
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Exatamente! Que faça proveito! E, para completar, darei um relógio de pulso que
pertenceu à minha falecida esposa. Estará melhor no pulso de sua amada. Por
favor saia pela porta da frente, para não quebrar outra vidraça. Apareça
sempre! Só não quero vê-lo no cemitério!
Lá
fora, uma intensa neblina cobria o Morro dos Ingleses. O passo cadenciado do
guarda da rua... Ao vê-lo
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Boa noite, Papai Noel!
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Boa noite! Feliz Natal para você sua família!
Com
um ligeiro aceno, Papai-Noel sumiu na densa bruma.
RODOLPHO CIVILE
CIVILE É UM MESTRE AO ESCREVER SEUS CONTOS SEMPRE COM UMA PITADA DE HUMOR. O ESCRITOR TAMBÉM CRIA OTIMAS ESTORIAS EM SEUS LIVROS DE TEXTO LONGO. MANIPULADOR EXIMIO DA ROTINA DE VIDA E DOS 'PERSONAGENS 'NO BAIRRO DO BEXIGA
ResponderExcluirCIVILE JUNTO COM ADONIRAN BARBOSA SÃO OS DOIS MAIORES MENESTREIS QUE OUVI E LI ENALTECENDO ESTE PEDAÇO TRADICIONAL DE SÃO PAULO.