11/08/2014

NÃO VÁ NA CONTRA-MÃO DA MANIFESTAÇÃO


Há dias que queria sair de casa, do trabalho, esquecer momentaneamente as contas, a família, o cachorro do vizinho. Tem dias que preciso do ar impregnado de energia, de  luta, para me sentir vivo.

Abandono tudo de repente, tomado da decisão inusitada de aparecer, gritar, sentir-me importante. Meu coração bate rápido, minha respiração fica ofegante. Lá vou eu, lembrando dos tempos de estudante, avançando com coragem.

 A camiseta que eu não vestia desde os tempos da ditadura brilhava tanto a ponto de encher meu peito de orgulho. Fogos de artifício na mochila, bandeira enrolada, carregada tal qual uma AR-15, lá vou eu, sem lenço, sem documento, lembrando e soltando meu grito de guerra. Sou jovem novamente, entro no meio da turba, perco a minha identidade numa massa humana imponderável e indomável. A televisão irá nos mostrar junto com mais de sessenta mil pessoas!

Será que meus filhos estarão me vendo no jornal das seis? A massa grita, explode, as bandeiras esvoaçam sobre nossas cabeças, até que bombas explodem na alegria incontida.
 
Estendo a minha bandeira e grito a plenos pulmões todas as palavras engasgadas por muitos anos. Não me lembro de mais nada.

Meus filhos me viram no jornal das seis, ensanguentado, caído e pisoteado agarrado à bandeira do Corinthians, no meio da torcida do São Paulo em pleno estádio do Morumbi...


ROBERTO ANTONIO ANICHE

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