14/03/2011

UM DIA ESPECIAL



Acordei com muita calma e comecei a escutar um barulho anormal. Havia um ruído de fundo constante, incomodo e um ou outro som mais alto. Espreguicei, bocejei, esfreguei os olhos ou o que parecia ser e coloquei a cabeça para fora.
O dia estava claro, ensolarado apesar do horário. A agitação iniciou muito cedo.
Crianças corriam de um lado para o outro brincando de pega-pega. Não sabia ao certo quais eram visitantes  e quais eram moradoras de tão animadas que estavam.
Algumas pessoas cabisbaixas, chorosas pareciam transportar sobre suas cabeças o peso do mundo, outras serelepes transbordavam alegria.
Os pequenos jardins estavam em festa. Uma variedade enorme de cores e aromas produzidos pelas azaléias, margaridas, rosas, cravos, flores do campo e tantas outras formando um belo tapete perfumado e bonito. Uma brisa refrescante roçava em minha face trazendo esses agradáveis perfumes da natureza que rapidamente se dissipavam no ar. Respirei fundo, estiquei meu esbelto corpo, leve, bonito..., também assim é demais, para ser mais honesto digamos “bem apresentado” e observei a vizinhança.
Do lado esquerdo, vi o Pedrinho todo limpinho, arrumadinho, dentes escovados, bem penteado sentado entre as margaridas procurando atentamente seus pais que não tardariam a aparecer como todos os anos desde 1985. Do lado direito Ana “a Loucacomo era conhecida na sua época de juventude observava com um profundo amor o velhinho magro e triste que insistia em acender uma vela que o Pedrinho vindo rapidamente do outro lado,insistia em apagar. Ana não se conteve e deu uma gargalhada debochada como era de seu feitio. Em frente o Janjão, a Tica e o Juninho sabiam que não receberiam ninguém, pois os seusmuito haviam partido.
Caminhei, flutuei um pouco, fui até a capela cheia de gente numa mistura de sons em que se sobressaiam alguns pai- nossos e ave-marias.
Agachada em um canto uma menininha chorava desconsolada. Seu pai afagava seus cabelos longos e com os olhos vermelhos procurava conter as suas próprias  lagrimas com palavras doces e suaves. Pairando no ar, um pouco acima de suas cabeças flutuava uma jovem mulher que não sabia direito o que lhe tinha acontecido, parecendo mais perdida e desamparada do que eles.
Voltei rapidamente para o meu canto na esperança de receber minhas visitas, mas ainda não havia ninguém.
Sentei-me um pouco cansado das andanças e relembrei com ternura breves momentos da minha vida. O nascimento da Sandy, em seguida do Caca, o fim do meu primeiro casamento, tão rápido e inesperado quanto o inicio dele,depois meu segundo,terceiro e quarto casamento. Por último a Bia, que mulher, que formosura, perto dela eu sumia. É o que chamam de mulherão. Não havia quem não a olhasse e cobiçasse quando passávamos. Encantava a todos os homens com sua beleza, juventude e desenvoltura. Foi também o que me atraiu nela. Fiquei completamente apaixonado e entregue a seus caprichos. E olha que foram muitos. Grandes viagens, jantares, algumas jóias caras, incontáveis finais de semana, agitação diurna e noturna. Alguns até a culpam pela minha inesperada partida. Mas, eu nunca acreditei, pois sempre confiei no grande amor que ela tem por mim.
Distraio-me com a constante movimentação. É um entra e sai de gente como nunca vi. 
Apesar de tudo, estava sozinho. Não havia recebido ainda nenhuma visita. Onde estaria a Bia, com suas juras de amor eterno sussurradas em meu ouvido em nosso ultimo jantar a luz de velas na marina de Ilhabela?  A Sandy e o Cacá com certeza deverão estar acordando agora com ressaca depois da balada de ontem à noite, ou quem sabe se perderam no caminho. Também não estão acostumados a vir me visitar aqui tão longe de casa.
O dia vai transcorrendo e eu me inquieto cada vez mais. Observo o céu. Está carregado de nuvens escuras que rapidamente vão se acumulando prenunciando uma tempestade que em poucos minutos desaba com força total.  As poucas pessoas que ainda insistiam em ficar correm para se abrigar ou tentam sair do parque.
A chuva que se precipitou lavou da minha mente a ultima esperança de rever hoje meus entes queridos. Acalmo-me e percebo que isso não me incomoda mais. Se não puderam vir hoje, quem sabe na próxima semana venham me fazer uma surpresa.  Afinal para quem mora aqui como eu, todo dia é dia de finados.  

Aida Lucia Pullin Dal Sasso Begliomini

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Agradecemos sua atenção. Se possível deixe informações para fazermos contato.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...