Provérbio popular.
Não é incomum
o jovem e o adulto de hoje protelarem ao máximo o casamento e a pretensão em
ter filhos com a alegação de que ainda há muito para se aproveitar da vida: viagens
para conhecer cidades, estados, países e povos de outras culturas; cursos
sem-fim para o crescimento profissional; idas a restaurantes com diversificadas
e saborosas gastronomias; troca de parceiros e de experiências sexuais sem
compromissos sérios; entretenimento em museus, cinemas, teatros e espetáculos
prediletos; poupança financeira para se comprar carros da moda, além dos mais
modernos e requintados recursos tecnológicos disponíveis; desincumbência de
pagar aluguel e de abdicar de outras mordomias gratuitas da casa dos pais; liberdade
de decidir e não dividir nada com ninguém – são alguns dos itens apontados
dentre as coisas boas da vida, atualmente.
Da mesma
forma, não é infrequente receber no consultório casais na faixa dos quarenta ou
cinquenta anos, que por vezes se apresentam como namorados (!), buscando ajuda
para ter um filho, os quais, por diversos motivos e justificativas, gozaram a
vida a seu modo. Será que esse anjinho que outrora fora preterido, pois era
tido como estorvo, seria benéfico numa idade quando os progenitores estariam
mais para avôs do que para pais?! Será que mais uma vez não se esteja
procurando o próprio interesse do que o da pretendida prole?
Na verdade, a
vida é muito curta por mais tempo que se tenha para se viver em comparação com
a infinidade de coisas boas e de prazeres que se apresentam na existência para
usufruí-los. Com certeza, o ser humano desde tempos imemoriais procura a
felicidade – Mas será que ela se confunde com a aquisição de produtos que a
sociedade de consumo vende? Será que se identifica com o sibaritismo disponível
a qualquer preço? Com a irresponsabilidade e a licenciosidade reinantes?
Lembro de
saudosa memória, meu sogro, Guido Dal
Sasso. Ele, que sabia como poucos congregar seus filhos e parentes ao redor de
uma mesa e de uma boa conversa, dizia que uma das melhores combinações culinárias
que tinha prazer em saborear era arroz com feijão bem temperado, acompanhados
por um suculento picadinho de carne!
Acredito que
dentre as coisas boas da vida – e porque não dizer prazerosas – estejam
momentos que nos passam despercebidos. Como é bom não sentir os dentes e unhas,
pois quando eles inflamam manifestam suas existências. Que delícia apreciar o
contraste de um céu azul anil, sem nuvens, com o verde viçoso das folhas das árvores
e a policromia das flores! Que satisfação poder utilizar uma latrina e esvaziar
o intestino e a bexiga, pois só se sabe quão salutares são esses órgãos quando
se tornam incompetentes para suas funções! Como é bom poder curtir uma chuva
torrencial tendo uma moradia para se abrigar! Que lindo escutar de descendentes
palavras como “papai”, “mamãe”, “vovó”, “vovô”! Como é prazeroso saber que se
pode ser útil a alguém através de um trabalho, ação ou empreendimento! Que
maravilha poder sentir o ar entrando e saindo livremente dos pulmões... a água
limpando e refrescando o corpo no banho... o ouvido detectando sons produzidos
por diferentes animais da fauna... a boca se enchendo de saliva diante de um
acepipe... os pelos dos braços eriçando e os olhos lacrimejando diante de uma
emoção!
Há dinheiro que pague a inocência de uma
criança; a esperança restabelecida a um idoso; a cura ou controle de uma
enfermidade do corpo ou da mente?!
Quem não
experienciou que existe maior alegria em se doar despretensiosamente ao próximo
do que dele receber alguma retribuição, ainda, peremptoriamente, não degustou
todas as boas coisas e os prazeres da vida.
Certamente
muitos encarcerados ou habitantes de nações escravocratas pagariam – se
pudessem – fortunas para que se lhes restituíssem a liberdade através do
singelo direto de ir e vir que a imensa maioria dos indivíduos usufrui.
Há muitas
coisas boas na vida e grande parte delas é graciosa e acessível a um
considerável contingente de indivíduos, pois lhes são inerentes. Basta apenas
detectá-las; aprender a admirá-las e saboreá-las diuturnamente ao longo da existência.
HELIO BEGLIOMINI
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