31/10/2011

PIZZA

PIZZA

Qualquer farinha que contenha glúten quando amassada com água, sovada e assada, recebe o nome de pão. O pão pode ter formas diversas, mas basicamente ele é: ou alto ou plano.
A pizza nada mais é do que um pão plano fermentado, feito com farinha de trigo. Inicialmente era um simples pão assado de um lado sobre uma pedra quente e em seguida virado, até que descobriram o forno oco de calor seco, que o assava simultaneamente dos dois lados. A sua origem se confunde com o pão árabe, ou pão pita, cuja etimologia sugere a mesma raiz fonética. A diferença está na cobertura, que a enriquece. Esta cobertura é basicamente um pomodoro, molho de tomate (sugo). Não se sabe se havia um pão com o nome de pizza antes do descobrimento da América, porque o tomate foi daqui para lá, mas é possível que já existisse e levasse outra cobertura, aliche, sardinha, patês diversos, ou então se comia em pedaços molhados em caldos quentes ou sopas, além de guisados.
Esta variante de pão ficou restrita à cidade e ao reino ou principado de Nápoles por séculos, porque cada povo europeu tinha seu pão próprio, incluindo aí as outras províncias italiotas, e ninguém se interessou por ela. Era um pão regional coberto com molho e, eventualmente, com queijo. A cobertura com queijo é mais recente, e constitui a forma clássica da pizza napolitana. Usou-se mussarela de búfala. Mussarela de búfalo não existe: búfalo não tem leite, tem esperma....
Mais recentemente, depois das migrações dos italianos para as Américas, ela foi aculturada em duas cidades: Nova Iorque e São Paulo. Nos Estados Unidos difundiu-se rapidamente com o surgimento da comida industrial e do fast-food. O processamento em larga escala criou o disco pré-assado, o que culminou na Pizza Hut e outras marcas. É uma bolacha crocante com cobertura. Bolachas também são pães planos. Para quem se acostumou com massa fresca recém assada isto parece uma heresia, mas o fato é que também é muito gostosa. Questão de costume e paladar.
Em São Paulo o consumo da pizza patinou até o fim dos anos 70. Havia umas poucas pizzarias, como a Castelões no Brás, a Zia Tereza no final da ainda estreita Rua da Consolação, alguma que não conheci no Bixiga, e a rede Paulino. Todas elas faziam massa grossa com borda saliente, porque a filosofia da pizza sempre foi esta: um pão massudo para encher a barriga e uma cobertura para dar sabor, refinamento.
Mas aí aconteceu. Uma modesta casa de pasto, a Monte Verde, situada entre o Bom Retiro e a Barra Funda, que nem era uma pizzaria específica, fornecia um cardápio variado, churrasquinhos e outros assados, umas guarnições como o arroz, a farofa. Tinha umas poucas mesas e uma clientela limitada, paroquial. Havia um forno no qual também fazia pizzas, à escolha do freguês, massa grossa ou massa fina. A moda da massa fina pegou! De repente, informados pela propaganda boca a boca, levas e mais levas de paulistanos foram lá comer a novidade. São as conhecidas hordas urbanas.
Então, oportunistas começaram a abrir pizzarias por toda a cidade, e também as pizzarias tradicionais já estabelecidas aderiram ao modismo da pizza fina. Esta assava mais depressa, economizava lenha ou eletricidade, dobrava o lucro e atraía fregueses. Isto coincidiu com o desastrado governo Sarney, quando a inflação chegou aos 80% ao mês, o dólar foi parar nas alturas e o trigo encareceu muito. Se antes uma pizza alimentava com sustança uma família, agora são necessárias três, e ainda se fica com fome. A cada vez mais a pizza vem sendo descaracterizada, hoje mais parece uma panqueca transparente. Já ouvi paulistanos que foram comer pizza em Nápoles dizerem que a pizza de lá é muito inferior à nossa, é uma pizza grossa (espessa), quase sem cobertura. Eu tive um primo que só gostava de bolo queimado. Sua mãe nunca acertava e ele cresceu comendo bolo queimado, um carvãozinho doce...
Hoje, a partir de São Paulo, a pizza avassalou o Brasil. Deve haver índio botocudo comendo pizza nas mais remotas nascentes do Amazonas. E temos um costume deveras singular: aqui se come pizza só à noite. Em Nápoles começam a comê-la no café da manhã, e passam o dia comendo pizza, como também o fazem os americanos. Outra particularidade: só nós, os “brasiliani”, a comemos no prato, com faca e garfo. Como qualquer pão, no mundo ela é comida com a mão. Mas diante da atual “pizza brasileira”, ou paulistana, sei lá, super fina, molenga, queijo fumegante derretendo e bastante molho na base, seria uma ousadia tentar comê-la na mão. Despenca, queima a mão, suja os dedos, mancha a roupa. Um desastre na etiqueta. Meleca tudo.
Uma descoberta minha, entre genial e fatal. Por melhor que seja a pizza, comê-la à noite acompanhada de chope, é azia na certa, de madrugada. Estimula a secreção de suco gástrico e libera um ácido clorídrico capaz de derreter aço inoxidável. Mas a diaba é danada de gostosa, e da cerveja nem se diga: vou me arriscar a ter uma gastrite ou uma úlcera duodenal. Nhacc! nhacc! :
- Tante grazie, paesano!

Geovah Paulo da Cruz

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