19/03/2011

NO BANCO TRASEIRO DE UM TAXI

No banco traseiro de um táxi, ela se aninha em meus braços, bem ali onde se aninha a noite.
De repente, nada mais importa. Importa apenas o silêncio pleno que nos envolve. Silêncio de um renascer transbordante de esperanças. Esperanças que ao mesmo tempo tememos porque voltamos a acreditar na vida, esta mesma vida, vilã, que já nos machucou tanto e tanto. Mas nosso arrebatamento traz o sorriso de volta. Traz o riso solto. Traz o mistério de um amor que ela não ousou declarar sem ter provas concretas, mas que está visível nos olhos. Na própria maneira de olhar. No modo de se deixar acolher. No jeito de me ouvir com as janelas do coração escancaradas. Como se não acreditássemos que somos abençoados no altar em que se transmutou um simples banco de táxi. E porque abençoados e porque banhados nesta luz infinita, nos refugiamos um no outro. Beliscamos a alma um do outro, só para ver se é verdade. Para conferir que o que nos inunda é um mesmo sentimento de pertencer, de um compartilhar que transcende as palavras, que faz jorrar emoções para todo lado, ali naquele banco de táxi. Queremos que o tempo congele e que nunca mais se acabe. A tão procurada outra metade nesta mulher caliente e sem pudores, como ela mesma se define.
Nada de nossos tropeços importa. Nada dos capítulos censurados da nossa biografia. Nenhuma dor. Nenhum atalho falso. Nenhum desvio de caminho. Nenhuma pedra. Nenhuma erva daninha a impedir o viço do crescimento.
Compomos juntos uma trilha sonora em cima de brotos que surgem nos galhos de uma árvore recém-saída do inverno. Temos que acreditar na primavera. Ela nasce de nós e dentro de nós. Nós sabemos. Nós sentimos. É isto que nos alimenta. Não sabíamos, tão famintos estávamos deste pão, deste doce alimento, deste leite, desta água que não para de correr. Deste abrigo, desta tempestade que guarda-chuva nenhum pode impedir de molhar, encolhidos que estamos, agarrados um ao outro como sobreviventes, neste banco traseiro de um táxi como um tapete mágico levitando e deslizando pelas esquinas noturnas de um amor buscando cometas e estrelas.

Sérgio Perazzo

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